Gripe Aviária, Influenza ou Covid-19? Especialista ensina como diferenciar os casos na prática clínica
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Infectologista Dr. Klinger Faíco alerta que sintomas se confundem, mas histórico epidemiológico e gravidade clínica são pistas-chave para diferenciar as infecções respiratórias
Com o registro recente de casos humanos esporádicos de gripe aviária (H5N1) no continente americano e o primeiro foco confirmado em granja comercial no Brasil, a atenção da comunidade médica se volta para um desafio cada vez mais plausível: reconhecer casos suspeitos na prática clínica, especialmente em contextos de síndromes respiratórias agudas.
Febre, tosse, dor no corpo e sintomas respiratórios inferiores são manifestações comuns tanto na gripe aviária quanto na Covid-19 e na influenza sazonal. A diferenciação, portanto, exige olhar clínico cuidadoso, coleta detalhada de histórico epidemiológico e, sempre que possível, apoio laboratorial.
“Na fase inicial, o quadro clínico pode ser praticamente indistinguível. O que muda são os contextos: a gripe aviária costuma estar associada a contatos com aves, surtos locais ou exposição ocupacional, e apresenta uma progressão mais agressiva, muitas vezes com evolução rápida para Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG)”, explica o Dr. Klinger Soares Faico Filho, médico infectologista da Escola Paulista de Medicina (UNIFESP), apresentador no InfectoCast e referência em virologia.
Similaridades e diferenças clínicas: quando suspeitar?
Segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, as infecções humanas por H5N1 costumam apresentar-se com sintomas clássicos de síndrome gripal: febre, tosse, cefaleia, dor de garganta e mialgia. Porém, o curso clínico frequentemente é mais severo.
Pontos que sugerem H5N1 na prática clínica:
Evolução precoce para dispneia e hipoxemia
Infiltrados pulmonares extensos em tomografia
Hemoptise, diarreia ou manifestações neurológicas em alguns casos
História de exposição a aves infectadas ou regiões com surtos documentados
Ausência de contato com pessoas sintomáticas (ao contrário da Covid-19)
“O H5N1 tem alta letalidade nos casos confirmados. A suspeição precoce salva vidas — tanto do paciente, quanto da comunidade. A notificação imediata é fundamental, mesmo em casos isolados”, reforça Dr. Klinger.
Foto: Dr. Klinger Faíco, médico infectologista / Divulgação.
O que o médico deve perguntar?
Um ponto central na diferenciação é o vínculo epidemiológico. O médico deve investigar ativamente:
Trabalho ou visita recente a granjas, abatedouros, feiras de aves vivas
Contato com aves silvestres mortas ou doentes
Viagens a regiões com circulação ativa de H5N1 (como Ásia, África, Chile, EUA)
Participação em resposta veterinária ou sanitária em surtos aviários
Sinais clínicos de gravidade desproporcional em relação ao tempo de evolução
“Diferente da Covid-19 ou da Influenza comum, que circulam amplamente entre humanos, o H5N1 exige esse rastreio de contexto. O quadro clínico sem o vínculo epidemiológico perde força diagnóstica”, destaca o infectologista.
Diferenças entre H5N1, Influenza Sazonal e Covid-19
Transmissão: H5N1 raramente se transmite entre pessoas; Influenza Sazonal e Covid-19 têm transmissão comum.
Exposição: H5N1 está ligada ao contato com aves infectadas, enquanto as outras duas ocorrem por contato com pessoas infectadas.
Início dos sintomas: É súbito na H5N1 e na Influenza Sazonal, e variável, às vezes insidioso na Covid-19.
Progressão: H5N1 é grave e rápida; Influenza costuma ser leve e autolimitada; Covid-19 varia de leve a grave.
Sintomas gastrointestinais: Mais comuns na H5N1, raros na Influenza e possíveis na Covid-19.
Letalidade: Muito alta na H5N1 (>50%), baixa na Influenza (<0,1%) e moderada na Covid-19 (0,5% a 1%).
Condutas recomendadas em caso suspeito
O Ministério da Saúde recomenda que casos com suspeita de infecção por H5N1 sejam imediatamente notificados às secretarias estaduais e ao CIEVS (Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde).
Além disso:
A coleta de swab nasal/nasofaringeo deve ser feita o mais cedo possível
Testes moleculares (RT-PCR) específicos para influenza A com subtipagem são essenciais
O antiviral oseltamivir pode ser utilizado precocemente, com benefício potencial
O paciente deve ser isolado em ambiente hospitalar com precauções de contato e aerossóis
“O manejo do H5N1 exige estrutura hospitalar, equipe treinada e suporte intensivo. Mesmo em países com recursos, a letalidade segue elevada. Por isso, vigilância, rastreio e contenção são mais eficazes que tratar quando a doença já se instalou”, enfatiza Dr. Klinger.
Uma ameaça latente
A possibilidade de que o H5N1 sofra uma mutação que facilite a transmissão sustentada entre humanos não é apenas teórica. Desde 2023, a OMS alerta para variantes com maior tropismo por células humanas, e episódios de transmissão entre mamíferos foram documentados em criadouros de visons e focas.
Com o vírus agora presente em granjas comerciais brasileiras, o alerta se intensifica. Profissionais de saúde devem estar preparados para identificar rapidamente casos suspeitos, contribuir com a rede de vigilância e orientar a população de forma segura e baseada em evidências.
“Esse é o tipo de ameaça que se constrói em silêncio. O momento de agir é agora — não quando os casos se multiplicam. A experiência da Covid-19 não pode ser esquecida”, finaliza o infectologista.
Klinger Faíco é médico infectologista com título de especialista pela Sociedade Brasileira de Infectologia. Doutor em Infectologia pela UNIFESP e MBA em Gestão em Saúde, atua com foco no diagnóstico e tratamento de doenças infecciosas, incluindo HIV, hepatites virais e IST’s. Além disso, o infectologista é CEO do InfectoCast, e professor universitário, fundador e consultor em controle de infecção hospitalar na Consultoria IRAS.
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